Por Valdir Perazzo
O advogado (público ou privado)
assume um compromisso com a ordem jurídica fazendo um juramento. E o juramento
é algo sério e divino. Victor Hugo, autor de “Os Miseráveis”, sobre o assunto
preleciona: “É coisa santa o Juramento. O Homem que presta um Juramento, não é
mais um homem; é um Altar, tem Deus em si”.
E qual é o juramento do advogado?
É o compromisso com a própria missão da OAB: “Prometo exercer a advocacia com
dignidade e independência, observar a ética, os deveres e prerrogativas
profissionais e defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado
Democrático, os direitos humanos, a justiça social, a boa aplicação das leis, a
rápida administração da Justiça e o aperfeiçoamento da cultura e das
instituições jurídicas”.
A OAB tem uma nota
caracterizadora que a distingue de outras entidades de fiscalização
profissional. Tem uma missão transcendental para a sociedade democrática,
que vem primeiro do que o dever de fiscalizar os seus membros. Está consignado
no art. 44, inciso I da Lei n° 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto), que
a OAB tem como finalidade “defender a Constituição, a ordem jurídica do
Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar
pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo
aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas.
Dito isto, me permito adentrar o
assunto que me propus – A Operação Delivery. É o tema de pauta. Nos
últimos três meses, todos os meios de comunicação do Estado do Acre, vêm se
ocupando do tema, e lhe reservando destaque. Move a máquina do Poder
Judiciário. A demanda não se limitou ao primeiro grau. Vários habeas corpus
foram julgados pela Câmara Criminal do Tribunal de Justiça e pelo Superior
Tribunal de Justiça. São vinte e dois réus. Em tese, pela acusação e pela
defesa, poderiam ser arroladas e inquiridas até 352 testemunhas. Precatórias
serão disparadas para vários Estados da federação. Enfim, um processo caro e
demorado aos cofres públicos da combalida economia acriana.
Ocorre, entrementes, que há uma
discussão em marcha –o assunto pode chegar também ao STJ, se é que ainda não
chegou- sobre a competência do juízo no qual está em trâmite o processo.
Alegou-se, em habeas corpus que já foi julgado pela Câmara Criminal do Tribunal
de Justiça, vencida a tese defensiva, por maioria de votos, de que o juízo da
2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco não teria
competência para julgamento do processo.
Ao meu sentir, a questão é ainda
mais profunda do que se tem cogitado. A discussão deve girar sobre a própria
constitucionalidade da criação da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca
de Rio Branco, na qual está em trâmite o rumoroso processo da Operação
Delivery. É uma questão de economia processual. Indaga-se: E se a criação da 2ª
Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco, através de um ato
normativo (Resolução), for declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça,
na sua composição plena, ou por outro tribunal de hierarquia superior? Todo
esse ingente esforço de movimentação da máquina judiciária será inútil, levando
ao desprestígio do Poder Judiciário. Reparem!
O ponto fulcral da questão é o
controle de constitucionalidade sobre a criação da 2ª Vara da Infância e da
Juventude da Comarca de Rio Branco, o que se deu através da Resolução nº
134/2009, pelo Tribunal de Justiça do Estado do Acre, evitando-se perda de
tempo e recursos em um processo dessa magnitude. Indaga-se: O Tribunal de
Justiça do Estado do Acre já poderia conhecer da questão? A resposta é
afirmativa. Em habeas corpus foi suscitada a questão da incompetência do juízo,
por ter sido criado por ato normativo. Por essa razão, o TJ-AC poderia ter
conhecido do tema.
Controle de constitucionalidade
–dizem os doutrinadores- caracteriza-se, em princípio, como um mecanismo de
correção presente em determinado ordenamento jurídico, consistindo em um
sistema de verificação da conformidade de um ato (lei, decreto, etc) em relação
à Constituição. É isso que precisa ser feito.
Ora, a 2ª Vara da Infância
e da Juventude da Comarca de Rio Branco foi criada pela Resolução nº 134/2009,
que estatuiu: “Art. 3º Autorizar a instalar da 2ª Vara da Infância e da
Juventude da Comarca de Rio Branco” (sic). Esse procedimento administrativo
(criação da Vara por ato normativo), choca-se com texto expresso da
constituição estadual: Art. 94. Compete, ainda, ao Tribunal de Justiça do Estado:
IV – propor a criação de novas comarcas e varas judiciárias”. Portanto, salvo
melhor juízo, criar Vara, somente por lei. O Tribunal de Justiça pode apenas
propor ao Poder Legislativo.
Admitir criação de uma Vara por
meio de Resolução (ato normativo) seria o mesmo que admitir o tribunal de
exceção, vedado pela constituição federal (art. 5º, inciso XXXVII). Aliás, os
Tribunais de Exceção são próprios dos regimes antidemocráticos. Democrático
como é o Brasil, a regra é os réus serem julgados pelo juiz competente (art.
5º, inciso LIII).
O mais famoso tribunal de exceção
foi o de Nuremberg, em que os réus, mesmo tendo advogados, aí já estavam
previamente condenados, dizem os advogados sobre os crimes praticados na 2ª
Guerra Mundial.
Valdir Perazzo é defensor público
Fonte: Jornal Ac24horas
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