terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

OPERAÇÃO DELIVERY E CONSTITUCIONALIDADE

Por Valdir Perazzo
O advogado (público ou privado) assume um compromisso com a ordem jurídica fazendo um juramento. E o juramento é algo sério e divino. Victor Hugo, autor de “Os Miseráveis”, sobre o assunto preleciona: “É coisa santa o Juramento. O Homem que presta um Juramento, não é mais um homem; é um Altar, tem Deus em si”.
E qual é o juramento do advogado? É o compromisso com a própria missão da OAB: “Prometo exercer a advocacia com dignidade e independência, observar a ética, os deveres e prerrogativas profissionais e defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social, a boa aplicação das leis, a rápida administração da Justiça e o aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas”.
A OAB tem uma nota caracterizadora que a distingue de outras entidades de fiscalização profissional.  Tem uma missão transcendental para a sociedade democrática, que vem primeiro do que o dever de fiscalizar os seus membros. Está consignado no art. 44, inciso I da Lei n° 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto), que a  OAB tem como finalidade “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas.
Dito isto, me permito adentrar o assunto que me propus – A Operação Delivery.  É o tema de pauta. Nos últimos três meses, todos os meios de comunicação do Estado do Acre, vêm se ocupando do tema, e lhe reservando destaque. Move a máquina do Poder Judiciário. A demanda não se limitou ao primeiro grau. Vários habeas corpus foram julgados pela Câmara Criminal do Tribunal de Justiça e pelo Superior Tribunal de Justiça. São vinte e dois réus. Em tese, pela acusação e pela defesa, poderiam ser arroladas e inquiridas até 352 testemunhas. Precatórias serão disparadas para vários Estados da federação. Enfim, um processo caro e demorado aos cofres públicos da combalida economia acriana.
Ocorre, entrementes, que há uma discussão em marcha –o assunto pode chegar também ao STJ, se é que ainda não chegou- sobre a competência do juízo no qual está em trâmite o processo. Alegou-se, em habeas corpus que já foi julgado pela Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, vencida a tese defensiva, por maioria de votos, de que o juízo da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco não teria competência para julgamento do processo.
Ao meu sentir, a questão é ainda mais profunda do que se tem cogitado. A discussão deve girar sobre a própria constitucionalidade da criação da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco, na qual está em trâmite o rumoroso processo da Operação Delivery. É uma questão de economia processual. Indaga-se: E se a criação da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco, através de um ato normativo (Resolução), for declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça, na sua composição plena, ou por outro tribunal de hierarquia superior? Todo esse ingente esforço de movimentação da máquina judiciária será inútil, levando ao desprestígio do Poder Judiciário. Reparem!
O ponto fulcral da questão é o controle de constitucionalidade sobre a criação da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco, o que se deu através da Resolução nº 134/2009, pelo Tribunal de Justiça do Estado do Acre, evitando-se perda de tempo e recursos em um processo dessa magnitude. Indaga-se: O Tribunal de Justiça do Estado do Acre já poderia conhecer da questão? A resposta é afirmativa. Em habeas corpus foi suscitada a questão da incompetência do juízo, por ter sido criado por ato normativo. Por essa razão, o TJ-AC poderia ter conhecido do tema.
Controle de constitucionalidade –dizem os doutrinadores- caracteriza-se, em princípio, como um mecanismo de correção presente em determinado ordenamento jurídico, consistindo em um sistema de verificação da conformidade de um ato (lei, decreto, etc) em relação à Constituição. É isso que precisa ser feito.
Ora, a 2ª  Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco foi criada pela Resolução nº 134/2009, que estatuiu: “Art. 3º Autorizar a instalar da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Rio Branco” (sic). Esse procedimento administrativo (criação da Vara por ato normativo), choca-se com texto expresso da constituição estadual: Art. 94. Compete, ainda, ao Tribunal de Justiça do Estado: IV – propor a criação de novas comarcas e varas judiciárias”. Portanto, salvo melhor juízo, criar Vara, somente por lei. O Tribunal de Justiça pode apenas propor ao Poder Legislativo.
Admitir criação de uma Vara por meio de Resolução (ato normativo) seria o mesmo que admitir o tribunal de exceção, vedado pela constituição federal (art. 5º, inciso XXXVII). Aliás, os Tribunais de Exceção são próprios dos regimes antidemocráticos. Democrático como é o Brasil, a regra é os réus serem julgados pelo juiz competente (art. 5º, inciso LIII).
O mais famoso tribunal de exceção foi o de Nuremberg, em que os réus, mesmo tendo advogados, aí já estavam previamente condenados, dizem os advogados sobre os crimes praticados na 2ª Guerra Mundial.
Valdir Perazzo é defensor público
Fonte: Jornal Ac24horas

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